O segredo sombrio da Volkswagen na Amazônia: Washington Post revela trabalho forçado
O Washington Post revela o passado sombrio da Volkswagen no Brasil: trabalho forçado e abusos em sua fazenda na Amazônia durante a ditadura militar. Descubra a investigação que expõe os horrores esquecidos.
Uma investigação aprofundada do The Washington Post, publicada em 23 de julho de 2025, expõe os horrores esquecidos sofridos por trabalhadores na vasta fazenda de gado da Volkswagen na Amazônia brasileira. A reportagem, intitulada “O Segredo da Volkswagen”, assinada por Terrence McCoy e Marina Dias, com fotos e vídeos de Rafael Vilela, joga luz sobre um capítulo brutal da história da montadora no Brasil, até então omitido nas recentes negociações de indenização por sua cooperação com a ditadura militar.
Washington Post revela trabalho forçado na fazenda da Volkswagen
A revelação chocou o padre e pesquisador de direitos humanos Ricardo Rezende Figueira, 73 anos. Ao ler uma manchete sobre a Volkswagen se redimindo por sua colaboração com o regime militar, Rezende percebeu que a matéria não mencionava os abusos ocorridos na Fazenda Vale do Rio Cristalino – uma propriedade quase duas vezes maior que a cidade de Nova York, localizada na floresta amazônica e governada pela liderança da empresa.
Rezende, que havia liderado uma investigação sobre as supostas atrocidades na fazenda décadas atrás, sentiu que “talvez não fosse tarde demais” para que a verdade viesse à tona.
Em 2019, Rezende procurou Rafael Garcia, do Ministério Público do Trabalho, compartilhando seus arquivos detalhados – mais de mil páginas de evidências que ele havia compilado e guardado por anos. Garcia, que não tinha conhecimento da fazenda da Volkswagen, ficou chocado ao examinar os registros. “Nunca vira um acervo tão rico, tão cuidadosamente coletado e preservado”, afirmou.
O dossiê, com depoimentos de dezenas de trabalhadores e suas famílias, datava de 1977 a 1987 e incluía declarações autenticadas, depoimentos policiais, autos judiciais e relatórios de legisladores.
Os documentos narravam como recrutadores contratados pela Vale do Rio Cristalino – uma subsidiária da Volkswagen do Brasil, cuja liderança incluía o presidente da Volkswagen do Brasil, Wolfgang Sauer, e o diretor de recursos humanos, Admon Ganem – atraíram centenas de trabalhadores sazonais e informais para a propriedade em Santana do Araguaia com falsas promessas.
Uma vez na fazenda, os trabalhadores estavam, segundo seus depoimentos, “presos — geograficamente isolados, enredados em dívidas, adoecidos pela malária e forçados a trabalhar sob ameaça de violência” para desmatar a floresta e abrir espaço para o gado.
As histórias são aterradoras: “Trabalhávamos de segunda a segunda, muitas vezes sem comer. Eles prometeram nos matar”, relatou um homem. Outros descreveram torturas brutais e o desaparecimento de pessoas. “Eles têm uma caverna onde matam pessoas e jogam os corpos”, alegou uma vítima.
Os registros identificaram 69 vítimas e citavam empreiteiros notórios na região, como Chicô (Francisco Andrade Chagas) e Abilão (Abílio Dias Araujo), que utilizavam fiscais armados para forçar o trabalho.
A Resposta da Volkswagen
Em comunicado ao The Washington Post, a Volkswagen do Brasil “refutou e rejeitou categoricamente todas as alegações” de abusos na Fazenda Vale do Rio Cristalino, afirmando seu compromisso com a dignidade humana.
Em documentos judiciais, os advogados da empresa argumentam que a Volkswagen era apenas acionista de uma empresa independente e que o governo estaria processando indevidamente uma parte não envolvida. A sede da Volkswagen na Alemanha não respondeu aos pedidos de comentários do jornal.
A investigação do The Washington Post, que incluiu análises dos arquivos de Rezende, registros judiciais, documentos do Arquivo Nacional do Brasil e entrevistas com 29 pessoas, incluindo 16 que trabalharam na fazenda e 9 que alegaram ter sido escravizadas, pintou um quadro devastador.
Histórias como a de Valdeci Alves Fumeiro, 74 anos, que disse ter sido forçado a trabalhar por sete anos sem permissão para sair, mesmo após um grave acidente, são exemplos da crueldade narrada.
Embora autoridades estaduais tenham confirmado a existência de trabalho forçado na fazenda quatro vezes no período, o The Post não encontrou registros de que trabalhadores tenham sido libertados ou que os supostos algozes tenham sido acusados.
A busca por justiça
O caso aberto por Garcia e sua colega Christiane Nogueira, em dezembro de 2019, é a primeira vez que o Brasil busca responsabilizar alguém pelo sofrimento humano ocorrido na corrida para desenvolver a Amazônia durante a ditadura militar.
Os promotores federais alegam que, entre 1974 e 1986, a Volkswagen explorou trabalho escravo e tráfico de pessoas em escala “generalizada e sistêmica” através de sua subsidiária, tornando a empresa controladora responsável final.
A Volkswagen do Brasil, então a maior montadora da América Latina, aceitou o desafio de criar gado na floresta, em um projeto que visava combater a fome mundial, mas que, segundo os relatos, custou a liberdade e a dignidade de inúmeros trabalhadores.
A impunidade, que por muito tempo prevaleceu na região, pode finalmente dar lugar a um acerto de contas, reacendendo um debate de décadas sobre as responsabilidades das grandes corporações em tempos de regimes autoritários e exploração ambiental.
Sou Robson Quirino. Formado em Comunicação Social pelo IESB-Brasília, atuo como Redator/ Jornalista desde 2009 e para o segmento automotivo desde 2019. Gosto de saber como os carros funcionam, inclusive a rebimboca da parafuseta.