Os sucessivos aumentos no preço do diesel têm levado cada vez mais caminhoneiros a esticar a jornada de trabalho para tentar aumentar a renda, para conseguir arcar com os custos mais elevados. Isso multiplicou o perigo nas estradas federais brasileiras, segundo se percebe pelas autuações por descumprimento da Lei do Descanso, que triplicaram no primeiro semestre deste ano.
A Lei do Descanso (Lei nº 13.103/15) determina que o motorista pare de dirigir por 30 minutos a cada seis horas de trabalho. É proibido passar mais de cinco horas e meia ao volante sem interrupção. No caso do transporte de passageiros esse limite é reduzido para quatro horas. A lei também obriga que os motoristas tenham intervalos de 11 horas ininterruptas entre um dia e outro de trabalho.
Desrespeito às pausas para descanso cresce e aumenta o risco de acidentes
Estatísticas da Polícia Rodoviária Federal (PRF), fornecidas a pedido da Associação Mineira de Medicina do Tráfego (Ammetra), revelam que as autuações por excesso de jornada aumentaram 218% no primeiro semestre deste ano. Em 2022 foram 50.467 autuações, contra 15.825 de janeiro a junho de 2021.
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Pesquisa da Confederação Nacional dos Transportes (CNT) mostra que há caminhoneiros que passam até 13 horas por dia ao volante, o que representa grande risco a todos os usuários das estradas.
O diretor científico da Ammetra, Alysson Coimbra, acredita que o aumento desse tipo de infração está diretamente ligado a questões econômicas. “Em dois anos o diesel acumulou alta de quase 90%, em média. Para conseguir um rendimento mínimo, os caminhoneiros estão tendo que trabalhar muito mais e isso impacta não só a saúde da categoria, mas coloca em risco a integridade física de todos os demais usuários das vias que circulam”, afirma.
Coimbra lembra que o alto custo de manutenção dos caminhões também contribui para que os motoristas desrespeitem a Lei do Descanso. O especialista ressalta que os pneus são um dos itens que mais oneram os motoristas – distribuídos entre os eixos dianteiro, truck e tração, possuem um rendimento de rodagem de 7.721km rodados, em média.
“Considerando que algumas composições como bitrem de 7 eixos, o custo total de substituição dos 26 pneus pode ultrapassar R$ 30 mil. Se adicionarmos a inflação a essa equação, veremos que o valor do auxílio caminhoneiro concedido pelo governo federal, somente até o mês de dezembro, está longe de representar um alívio para o problema do custeio dos insumos e do combustível”, aponta Coimbra.
“Para reduzirmos as ocorrências de trânsito na categoria, precisamos de políticas públicas intersetoriais que estão diametralmente opostas às praticadas atualmente”, diz.
Impacto na saúde dos motoristas
O excesso de jornada também cobra um alto preço: o corpo não resiste ao excesso de trabalho e a saúde inevitavelmente é afetada. O estresse, a falta de descanso, o sedentarismo, a solidão, os longos períodos sentado e a alimentação irregular aumentam o risco de várias doenças fatais.
“O uso de estimulantes e substâncias psicoativas para evitar o sono comprometem sentidos cruciais para uma direção segura, além de causar dependência e elevação continua da dose para se obter efeitos cada vez menores”, alerta Coimbra.
“Falhas humanas causam 90% dos sinistros de trânsito. E os acidentes envolvendo veículos pesados são potencialmente mais letais que os que envolvem apenas carros de passeio”, completa.
Segundo o especialista em Medicina de Tráfego, a situação é extremamente preocupante, ainda mais com a recente edição de uma Medida Provisória do governo que suspende a fiscalização de jornadas em alguns trechos de rodovias.
“O sistema nacional de trânsito está exaurido devido às inúmeras intervenções político-eleitorais que enfrentou. Está na hora de parar de jogar para a plateia e trabalhar com responsabilidade pela preservação do bem mais precioso que possuímos: nossas vidas”, afirma o diretor da Ammetra.